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Flávia Durante

Anitta contrata dançarinas gordas, mas dá show de gordofobia por aí

Flávia Durante

14/11/2017 04h00

Anitta entre as dançarinas plus size Thais Carla e Tatiana Lima (Foto: Divulgação/TV Globo)

Há menos de um ano, Anitta contratou dançarinas gordas para o clipe de "Paradinha" e para o seu corpo fixo de balé. A cantora foi muito celebrada por fãs, pela mídia e até por ativistas pela iniciativa de representatividade e inclusão. Eu mesma sou muito fã do trabalho dela e adorei a atitude! Porém, Anitta andou publicando uma sequência de vídeos em seu Instagram que foi um show de gordofobia.

Encarnando o estereótipo manjadaço da "gorda comilona", disse em inglês para seus colegas de trabalho que não comeria muito pois se ganhasse peso a imprensa não a reconheceria. E "encenou" como seria uma pessoa gorda andando e falando de uma forma grotesca. E em tom de deboche disse ainda que viraria modelo plus size de tanto comer. Cenas lamentáveis que podem disparar gatilhos em pessoas com problemas de autoimagem e transtornos alimentares.

E a coerência ao discurso de inclusão?

Não dá para se cobrar militância coerente de artista pop pois não é esse o papel deles. Mas, ao abraçar a bandeira da diversidade e inclusão em seu trabalho, ela deveria no mínimo ter mais responsabilidade com o que fala. E respeitar as fãs gordas que acreditaram no seu discurso inclusivo. O corpo gordo não é uma piada.

Um estudo de 2010 coordenado por Marle Alvarenga, doutora nutricionista pioneira da pesquisa de transtornos alimentares no Brasil, revela que 64,4% de universitárias do sexo feminino nas cinco regiões do país gostariam de ser mais magras. Isso acaba sendo comportamento de risco para distúrbios alimentares. Levantamento da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo feito em 2014 revelou que 77% das jovens em SP apresentam propensão a desenvolver anorexia, bulimia ou compulsão por comer.

Segundo o mesmo estudo, quase metade das meninas de 10 a 24 anos acredita que mulheres magras são mais felizes. Acredito que a cantora não gostaria de ajudar a perpetuar esse estigma se apoia tanto a diversidade e a inclusão de todos os tipos de corpos.

Anitta não "deu" espaço: dançarinas conquistaram

As dançarinas Thaís Carla e Tatiana Lima são extremamente talentosas. Thaís foi dançarina do programa "Legendários", da Record, por quatro anos. Há oito ganhou o quadro "Se vira nos 30", do Faustão, com uma apresentação épica de street dance. Tatiana é professora de Educação Física, dança desde os 13 anos, e trabalhou por dois anos como bailarina do circo do Marcos Frota. Anitta não "deu" simplesmente espaço para elas, ambas o conquistaram devido ao seu talento e esforço.

Anitta se destacou ao comandar sua própria carreira em uma indústria na qual geralmente as mulheres são muitas vezes objetos decorativos. Fez parcerias certeiras, hits que viraram verdadeiros hinos, dança como ninguém, é carismática e talentosa. E acabou se tornando um grande exemplo de mulher empoderada. Tem 24 anos e não é mais uma mocinha despreparada – é uma pessoa inteligente e bem articulada. Então deveria tomar mais cuidado com o que fala, mesmo que despretensiosamente nas redes sociais, pois tudo o que faz agora é acompanhado por milhões de jovens em construção de sua autoestima e identidade.

Sobre a autora

Flávia Durante tem 41 anos e é comunicadora, DJ e empresária nascida em São Paulo e criada em Santos. Desde 2012 produz a Pop Plus, feira de moda e cultura plus size, com média de público de 10 mil pessoas por evento. Ao longo destes 6 anos tem desmistificado conceitos e conselhos que mulheres (e homens também) vem ouvindo há décadas sobre os padrões da moda.

Sobre o blog

Um espaço para falar de mercado e moda plus size, beleza, acessibilidade, bem estar e autoestima.

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